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Ophiussa Ex Machina, de Ricardo Barbeito
DATA
27 Jul 2020
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AUTOR
Francisco Correia
Ricardo Barbeito apresenta Ophiussa Ex Machina na Thirdbase até final de julho. O trabalho é o resultado imediato do tempo em que esteve nesta 5ªa temporada de residências artísticas, juntamente com Adriana Proganó. Mais do que uma exposição, pois poderiam ser várias, aquilo que vemos…

Ricardo Barbeito apresenta Ophiussa Ex Machina na Thirdbase até final de julho. O trabalho é o resultado imediato do tempo em que esteve nesta 5ªa temporada de residências artísticas, juntamente com Adriana Proganó. Mais do que uma exposição, pois poderiam ser várias, aquilo que vemos é um projeto com diversas ramificações intrincadas, fruto de vários meses de pesquisa e conceção, acerca do qual, dada a sua lógica vincadamente narrativa, o artista nos falou um pouco.

Ricardo Barbeito – O título Ophyusa ex-machina é inspirado numa expressão que vem da tragédia grega, Deus Ex Machina, que se refere a uma situação despropositada, que não tem sentido nenhum na realidade, mas que tem no enredo. Sendo sempre uma solução mirabolante, é capaz de fechar a história.

[No piso superior] A máquina de tabaco disponibiliza aos visitantes roteiros/itinerários retirados de um livro que fala sobre as calçadas da cidade de Lisboa. A primeira das três referências que este projeto tem é, portanto, um livro que se chama Empedrados artísticos de Lisboa, que faz um mapeamento dos desenhos e dos padrões, da estrutura e de como é feita a calçada de Lisboa. Apropriei-me desses itinerários e criei um objeto. Assim, para além de intervir com peças num espaço, acabo por sugerir novos percursos e novas formas de conhecer a cidade. Foram feitos 3 itinerários. Cada um tem uma imagem de uma pedra que recolhi e dois pontos de partida (um de partida e outro de chegada, sem nenhuma ordem), pelo meio os outros pontos desenham um percurso. Estes “kits de passeio”, como lhes chamo, vêm no formato de um maço de tabaco e podem ser comprados na máquina. Além disso, vêm com um kit de picotagem que pressupõe que quando chegamos aos sítios [assinalados no mapa], vamos abrindo buracos na folha, que depois poderão ser sobrepostos num outro mapa qualquer – no que poderá ser entendido como uma expansão metafórica do território, através de passeios por outros locais.

Outra das referências é um artigo dos anos 1920’s do Diário de Lisboa – que me conduziu depois ao livro – que se chama Pornografia, de Joaquim Manso, e que fala de uma cidade desenvergonhada, “que se sensualiza com tal ardor de febre que até parece que as pedras da calçada faíscam lume”.

A terceira referência diz respeito ao mito grego sobre a fundação da cidade de Lisboa e das suas sete colinas, que tem que ver com Ulisses. O mito diz que esta era uma terra habitada por serpentes (daí o nome Ophiussa, para os gregos) e era governada por uma rainha meio mulher, meio serpente, que não deixava ninguém se estabelecer. Ulisses durante a sua viagem terá passado por aqui; a rainha apaixonou-se, e ele convenceu-a a criar a cidade mais bela do mundo, a Ulisseia. Entretanto, Ulisses acaba por zarpar em segredo, dando um desgosto enorme à rainha, que levada pelo desespero e pela mágoa deixou um rasto de ira que terá dado origem às colinas da cidade.

Quando fiz os três trajetos por Lisboa, para além de ter captado imagens, recolhido pedras, e feito algumas frottages e moldes de pormenores da cidade (etc…), uma das coisas que reparei é que a calçada está sempre em mau estado, e, por isso, estão sempre pedras a soltarem-se. A partir daí, associei a desagregação da calçada com a consequência da energia deixada por essa figura mítica da rainha serpente. Claro que isto é uma metáfora, mas foi a partir daí que comecei a recolher pedras e a fazer moldes, que são a captação de partes de objetos, como a fonte, o bebedouro e o chafariz. É também uma questão ligada à memória destes lugares. Por sua vez, através dos moldes das pedras criei aglomerados, que formam estas “peles”. São construções fictícias em que usei alguns dos padrões do livro e dos desenhos que fui fazendo, e que integram esta exposição.

Por isso, a instalação [na Thirdbase] está dividia em 3 núcleos, a pele da calçada (que pode ser a pele da cidade); o desenho realista das pedras; e as esculturas de fita-cola de papel, que captam as formas de pormenores arquitetónicos. Depois, ainda a partir dos desenhos realistas da pedra, fiz estes desenhos que costumo chamar “desenhos ampliados” em que planifico a pedra no papel e com a fita-cola transfiro o desenho e as sujidades – como se fossem as impressões digitais das pedras – para outra folha.

Para ver até dia 31.07.2020 na Thirdbase, em Lisboa.

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