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The Boat is Leaking. Uma exposição em Veneza.
DATA
15 Nov 2017
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AUTOR
Mário Caeiro
Exposição The Boat is Leaking. The Captain Lied na Fundação Prada em Veneza. This visually powerful, multi-layered environment bestows expression and meaning on the everyday and on the worlds of yesterday and today, between apparent normality and catastrophe, in a society divided between lust for…

Exposição The Boat is Leaking. The Captain Lied na Fundação Prada em Veneza.

This visually powerful, multi-layered environment bestows expression and meaning on the everyday and on the worlds of yesterday and today, between apparent normality and catastrophe, in a society divided between lust for life and loss of trust, extreme distress and never-ending hope.

The Boat is Leaking. The Captain Lied.

The Boat… celebra o rigor do craft e a amplitude reflexiva de três criadores alemães. Num inovador conceito expositivo, presenciamos a desconstrução mitológica de um mundo que é preciso começar a pensar reconstruir.

© Agata Wiórko

A exposição propõe um percurso transmedia em que somos continuamente surpreendidos pela nossa própria curiosidade e a vontade de estabelecer ligações entre o que vemos e as situações que atravessamos. Ecos do mundo e da própria história da música ou do teatro são reconstituídos como dimensões de um todo sociopolítico cuja fragmentação a arte acha maneira de articular. Por detrás da ironia do título esconder-se-á um luminoso (e bem germânico) otimismo?

© Agata Wiórko

© Agata Wiórko

© Agata Wiórko

The Boat…  é essencialmente uma celebração da unidade entre teatro, artes visuais e o próprio design expositivo. Expõem, em resultado de um prolongado diálogo com o curador Udo Kittelmann os artistas Thomas Demand, Alexander Kluge e Anna Viebrock. Descobridores e investigadores de pistas, testemunhas e cronistas do tempo que passa ou passou, os três artistas preenchem a seis mãos as salas e corredores de Ca’Corner della Regina com uma proposta complexa, em que obras de arte, filmes e cenários de teatro e de ópera se vêm como que forçados a uma polinização cruzada. O resultado – espetacular – é a possibilidade de uma nova tipologia da exposição de arte. Um ‘quotidiano’ que nos envolve totalmente (e que aliás se expõe a si mesmo, por vezes com as marcas do uso prévio – já que muitas estruturas são oriundas de espetáculos realizados Europa e Mundo fora).

© Agata Wiórko

© Agata Wiórko

No cruzar de linguagens e virtualidades estéticas, a constelação de referências e citações, que captamos na inusitada acoplagem de fotografias, vídeos e artefatos cenográficos e de mobiliário, cada user desta exposição pode visitá-la ao ritmo que bem entender, perdendo-se literalmente no circuito de espaços-tempos acerca de cujas entradas e saídas não é dada indicação.

Dá vontade de definir a experiência como um scape room sonhado entre dois recitativos em Bayreuth… ou um crossbred de The Game (de Fincher) com as instalações do Palais de Tokyo…  Em suma, trata-se da imersão num imaginário-quotidiano de um realismo unheimlich, fruto de um labor colaborativo em que a sensação de que assistimos a algo de absolutamente experimental de todo impede um desopilante prazer do texto, para evocar Barthes. É teatro sem atores, é cinema às claras e sem cadeiras e é fotografia sem autonomia – cada foto como se estivesse a decorar a casa (do conceito). Numa palavra, a exposição questiona de forma rigorosa as sempre problemáticas permeabilidades entre espetador e obra. O esquema consiste em alternar com perfeita musicalidade a imagem filmada e a fotográfica, o percurso iluminado e o escurecido, os espaços abertos e os e clausura, etc.

© Agata Wiórko

Duas palavras sobre cada um destes senhores artistas: Anna Viebrock é set designer para teatro e ópera, reconhecida pelo seu labor para as companhias mais importantes da Alemanha e do mundo; Alexander Kluge é um veterano realizador de cinema e vídeo, também escritor e argumentista, com um notável percurso em televisão; Thomas Demand é artista visual e professor em Escultura, reconhecido pelo seu trabalho em fotografia. Em conjunto e arrumando os egos fora do processo, aceitando a lógica de contiguidade-continuidade desejada pelo curador, desenharam um percurso em aberto cujos dispositivos espaciais nos desafiam a sentarmo-nos, a subirmos a um palco, a atravessar um porta falsa, a procurar uma saída ou demorarmo-nos na contemplação…

© Agata Wiórko

A mais diferenciadora das componentes deste espetáculo raro é a proficiência cenográfica de Viebrock, cuja inspiração advém da observação de edifícios e interiores banais, para além de documentos visuais que recolhe nas suas viagens, que depois sublima através de apurados processos de colagem.

Claro está, o que é gerado por este experimento é uma miríade de encontros, incluindo connosco próprios, que nos reconhecemos espelhados na perplexidade dos companheiros-visitantes, uma comunidade efémera continuamente reconfigurada: os companheiros da viagem podem aparecer de qualquer lado, de onde menos esperamos.

© Agata Wiórko

© Agata Wiórko

Assim, a cena teatral transfigura-se em jogo, o vídeo irrompe na realidade, cenários de ópera funcionam como dispositivos escultórico-arquitetónicos. Assim se joga ao toca-e-foge com as noções tanto de presente como do próprio tempo. O espetador acaba por participar performativamente na lógica expositiva.

Pelos vistos, o mundo continua a poder ser recontado e continua a ser partilhável, pelo menos entre eleitos e nómadas. Vislumbrada através dos cruzamentos transmediáticos mais inesperados, a consciência emocional e teórica da complexidade do mundo ainda é uma iluminação.

© Agata Wiórko

© Agata Wiórko

© Agata Wiórko

© Agata Wiórko

© Agata Wiórko

© Agata Wiórko

Agradecimento especial: Axel & May Vervoordt Foundation e Fondazione Musei Civici di Venezia

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