Sediado em Lisboa e composto por três músicos profissionais, o NOW Collective pretende criar ambientes onde o som seja acedido de forma presente e a música não seja apenas um produto consumível, mas um portal para a autoexpressão de um público reunido. O seu mais recente evento comissariado focou-se em oferecer frequências de cura. A neurociência, na sua sobreposição com as modalidades somáticas, tem afirmado que as frequências binaurais têm efeitos variados no sistema nervoso, o que pode ser benéfico. Juntamente com uma sessão de meditação guiada, o NOW Collective, de forma subtil e precisa, facilitou a aprendizagem do público sobre esta forma de experienciar o som. O coletivo é conhecido por criar espaços acolhedores e seguros, onde artistas podem mostrar os seus trabalhos mais recentes, propondo formas inovadoras de conexão. Esta nova iteração da sua prática curatorial destaca a sua ênfase em testar os limites do que é considerado um "evento" ou mesmo "um evento musical", transformando o evento num happening experimental em torno da cura. Ao explorar a construção de comunidades enquanto tal, o NOW continua a sua missão de preservar os efeitos táteis e sensíveis do som
Josseline Black: Como definem a vossa missão enquanto coletivo vocacionado para o som?
NOW: O nosso objetivo é tornar as experiências sonoras acessíveis a todos e criar novas formas de experienciar a música, para lá dos formatos tradicionais. Deste modo, pensamos fora da pista de dança, em novos espaços e dispositivos que nunca foram feitos antes, e fazer perguntas que nunca foram feitas antes. Fomentamos o meio presencial, tentando partilhar o conhecimento de todos numa plataforma e espaço vocacionado para o divertimento. Mas sempre de forma presencial, não online, nem em qualquer plataforma de redes sociais.
JB: Como caracterizam a vossa filosofia e a forma de se organizarem relativamente à digitalidade e ao digital?
NOW: Sempre quisemos desafiar um pouco os ambientes altamente digitalizados e a forma como afetaram o comportamento das pessoas nesses ambientes, a relação entre elas e o prazer do som e da música. Não somos antidigitais, somos apenas pró-analógicos. Estamos a tentar propor formas mais lentas, mais significativas e intencionais para as pessoas se conectarem, limitando as nossas publicações no Instagram apenas às informações necessárias, sem que haja a necessidade de estabelecer um arquivo de tudo o que aconteceu antes. O que queremos realmente é que as pessoas estejam presentes nos momentos que proporcionamos, para que se torne algo que permaneça no coração e na mente das pessoas, em vez de um legado digital. Também queríamos brincar com a presença e com a sensação de estarmos realmente num espaço físico, através da partilha, e de atividades físicas, como desenhar ou facilitar a conversa com cartões de comunicação. Na nossa última iniciativa criámos um ambiente onde as pessoas podiam realmente estar presentes de forma consciente. A razão pela qual nos chamamos No One’s Watching começou no sentido literal. A ideia era a vigilância e o facto de muitas pistas de dança estarem agora mais preocupadas em documentar o momento do que em estar presentes. O No One’s Watching, enquanto plataforma, representa visibilidade e promove coisas que são menos visíveis, sem documentação obrigatória.
JB: Como definem a expressão “escuta profunda”?
NOW: O que fazemos insere-se mais no âmbito de uma missão, do que da escuta profunda. A escuta profunda vem de um ângulo de curadoria musical e, na sua forma mais pura, trata-se de música, de apreciar música na sua forma mais pura, orientada pela lente de alguém que é um músico respeitado. O que procuramos fazer é produzir – não importa o tipo de música, não importa o tempo que a pessoa vai apresentar a sua performance musical ou há quanto tempo pratica… isso não nos interessa verdadeiramente. Trata-se antes da experiência que criamos e da atmosfera.
JB: Podem partilhar um pouco sobre o feedback que receberam das pessoas que se reúnem em torno dos seus acontecimentos?
NOW: Curiosidade. Na realidade, ninguém sabe o que vai acontecer a seguir, nem para onde vamos. Precisam de confiar um pouco em nós. Eles precisam de confiar em nós e na nossa missão, e acho que se surpreendem positivamente todas as vezes.
JB: O mais recente happening que desenvolveram abordou as frequências e o desbloqueio de um certo tipo de experiência psicológica ou espiritual através do som. De onde surgiu esta ideia?
NOW: Surgiu da curiosidade em apresentar algo diferente numa comunidade. Os sons afetam a forma como nos sentimos, e isso liga-se à questão da corporalidade. Tentámos ajudar as pessoas a sentirem-se presentes e a sentirem-se num espaço onde se sintam seguras para se expressarem. As frequências são uma versão muito simplificada disto. Pensar no poder das frequências de cura abre-nos à possibilidade de trabalhar com praticantes e pessoas que, com muitos anos de experiência, já trabalhavam a cura. Isto não era algo a que o público estivesse particularmente habituado, mas também nunca prometemos fazer sempre as pessoas dançar.
JB: Como veem o progresso do vosso coletivo ao longo do tempo?
NOW: Temos a ambição de manter tudo o mais orgânico possível e continuar a fazer esta comunidade crescer. Tivemos muita sorte com as pessoas que vieram aos nossos projetos desde o início, que voltaram sempre, e com os novos espectadores que trouxeram. Os visitantes dizem sempre que é acolhedor e intencional. O facto de todos terem tido experiências tão viscerais com a meditação que fizemos, mostrou-nos que estavam abertos a ela, o que consideramos ser uma verdadeira bênção, porque confiaram em nós para algo especial.