Esta foi a segunda edição do Circuitos, que contou com a participação de 55 espaços em toda a cidade do Porto. Mais do que um percurso por exposições enquanto momentos de apreciação estética, considero que esta iniciativa se destaca pela reunião e abertura da comunidade artística e cultural do Porto, entre si e com o público. Não posso deixar de destacar o excelente trabalho por parte da organização desta iniciativa, numa inegável demonstração de compromisso municipal com a cena artística da cidade. No entanto, o consumo em massa de exposições resulta necessariamente numa transformação das próprias exposições, que deixam de existir no contexto restrito do espaço para que sejam pensadas no âmbito de uma exposição municipal que ocupa a totalidade da cidade do Porto. Tornam-se, voluntariamente ou involuntariamente, parte de um todo no qual se poderão reconhecer tendências curatoriais e temáticas. Por esta razão, o Circuitos é, acima de tudo, um evento social.
Sobre a importância do social: sempre considerei essencial que os espaços culturais integrem os hábitos culturais da população, de modo que - antes de serem visitados - sejam espaços habitados. Um bom exemplo é a presença - ou ausência - de cafés em instituições culturais. Seja o café de Serralves (infelizmente pouco convidativo) ou o do Museu Soares dos Reis (inexistente), parece-me que reconhecer a importância destes espaços informais é também reconhecer a relevância do encontro e da partilha. É neste sentido que me refiro ao Circuitos: um evento social que considera a importância das relações sociais na construção de cultura enquanto fenómeno integrado.
Sobre a arte: a qualidade geral das exposições é autoevidente, desde os espaços institucionais até aos ateliers dos artistas. Na verdade, não é possível passar pelo Porto sem reconhecer o valor da produção artística e cultural da cidade. Deixo, ainda assim, uma nota de preferência pelo trabalho de Juliana Campos, exposto na galeria Mais Silva, e pelas obras de Francisco Trêpa, tão maravilhosamente incluídas numa exposição coletiva Lúcido Devaneio – Panorama da Arte Contemporânea Portuguesa na Galeria Municipal, e ainda pela oportunidade (sempre bem-vinda) de ver Jorge Molder, na Casa São Roque. Uma tendência que - não sendo recente, não deve por isso deixar de ser referida - é a da interseção entre o trabalho do artista e do curador, manifesta na conceção do processo como obra e da obra como processo. A proposta heideggeriana do caráter instalador da obra como motivo da exigência da mesma para ser instalada, encontrou na curadoria a sua maior promotora. Confesso, no entanto, que gostaria de ter observado nas exposições visitadas uma curadoria menos interventiva, particularmente nos espaços independentes. Refiro-me a um tipo de curadoria que tende a institucionalizar o trabalho artístico através de uma limpeza impositiva que remete para um White Cube, mesmo que conceptual, e que pode retirar à obra a oportunidade de viver o momento presente para pertencer ao tempo conservado, parado, da instituição. Não se trata de lhes retirar o valor, mas a oportunidade de existirem no espaço e tempo a que pertencem.
Não me tendo sido possível visitar os 55 espaços que participaram no Circuitos’25, deixo uma sugestão que pode ser útil a quem, como eu, queira continuar a descobrir a arte contemporânea no Porto: a plataforma do Mapa da Arte Contemporânea do Porto, onde estão identificados - senão todos, quase todos - os espaços de exposição e produção artística da cidade.